Estima-se que no Senegal, haja 400 novos casos anuais de fístula obstétrica [Fonte: Departamento de Saúde Reprodutiva, Ministério da Saúde] e que a região de Tambacounda seja uma das mais afetadas. A taxa de mortalidade em Tambacounda é de 395 mortes para cada 100.000 nascidos vivos. O direito à informação representa um importante pilar para permitir que as pessoas conheçam melhor os seus direitos quanto à saúde reprodutiva e o acesso aos cuidados com a saúde. A ARTIGO 19 implantou uma série de atividades na região visando a reduzir a taxa de mortalidade materna resultante da fistula obstétrica.
Uma fístula obstétrica é uma lesão reto-vaginal ou na bexiga resultante de um parto prolongado e difícil. Há várias causas para as fístulas obstétricas, inclusive a gravidez com pouca idade, mutilação genital feminina, e pouco espaço entre as gestações. Essas causas, entretanto, não são bem conhecidas pela maioria da população, especialmente aquelas que vivem em áreas rurais e carentes. Com frequência, as regiões mais afetadas são as mais remotas, com um elevado índice de pobreza, onde o acesso aos cuidados com a saúde permanece limitado, e onde meninas e mulheres continuam submetidas a praticas culturais danosas.
Desde junho de 2012, a ARTIGO 19 África Ocidental mantém um programa sobre o direito ao acesso de informação sobre saúde materna, e mais precisamente, sobre a luta contra fístula obstétricas no Senegal, particularmente na região de Tambacounda.
Entre dezembro de 2012 e março de 2013, a ARTIGO 19 realizou uma série de atividades (pesquisa, pesquisas em campo e treinamentos) em Tambacounda visando a abordagem da taxa de mortalidade por fístula obstétrica por meio do acesso à informação.
Os resultados mostram que frequentando o treinamento da ARTIGO 19, os participantes ficaram convencidos da necessidade do acesso à informação para o melhoramento de sua vida diária e para o encorajamento do seu poder de tomada de decisão.
Durante o treinamento, denominado O Direito à Informação na Luta contra Fístulas em Tambacounda (Right to Information in the Fight Against Fistula in Tambacounda), realizado nos dias 22 e 23 de março de 2013, os participantes (19 homens e 39 mulheres) puderam discutir como enfrentar a estigmatização da fístula obstétrica. Devido à falta de informação, vários participantes reconheceram que eles tinham mulheres estigmatizadas, sofrendo com fístulas, antes de sua participação no treinamento da ARTIGO 19.
Em resultado do treinamento, os participantes sentiram-se bem preparados para fornecerem informações sobre fístulas, e agora se consideram vozes autênticas para solicitarem e compartilharem informações.
“Desde o meu treinamento, agora eu tenho coragem para bater na porta do meu médico local ou na porta da minha enfermeira para pedir informações”, diz Alassane Camara.
Abaixo, reproduzimos algumas impressões de participantes presentes ao workshop organizado em Tambacounda.
Mamadou Ba, Conselheiro de Desenvolvimento de Vizinhança, 44 anos
“Sim, o acesso à informação é importante na medida em que a fístula é curável, e é graças a esse treinamento que agora eu sei disso, e que desde então eu compartilhei essa informação. É bom ser informado, ajuda a prevenir certas doenças e ter conhecimento”.
Sim, compartilhei essa informação ajudando uma mulher (mãe de quatro filhos) de uma das vilas na vizinhança, para curar a fístula. “Com a ajuda de uma Badiènou Gokh [1], Sinthiou Sow, agora ela está sendo monitorada no hospital regional de Tambacounda”.
Ngolo Tamega, Conselheiro de Desenvolvimento da Vizinhança de Pont
“Depois de treinamento, entrei na internet para conseguir mais informações sobre os perigos da fístula e isso permitiu que eu adquirisse muito conhecimento sobre o assunto e compartilhasse essas informações com meus amigos e com pessoas na minha vizinhança. Até mesmo detectei uma mulher com uma fístula. A ARTIGO 19 é realmente muito bem-vida, a informação é um direito para todos os cidadãos do mundo, exatamente como o direito a comer, a se vestir, a ser tratado por médicos”.
Diouma Sow, Profissional de Saúde da Aldeia
“O acesso à informação permite que sejamos informados sobre os perigos e as consequências de determinadas doenças e outras coisas, e por isso é que é importante para melhor a vida de uma pessoa.
Depois do treinamento, fiz algumas perguntas no centro de saúde de Gourel, e eles me deram informações consistentes com as informações fornecidas durante o treinamento da ARTIGO 19.
Sou uma profissional de saúde da aldeia e estou em contato direto com pais de etnia Fula na vila. Depois do treinamento, eu os conscientizei sobre os perigos do casamento prematuro e da circuncisão feminina na medida em que essas práticas podem resultar em fístula”.
Maguette Dione, 56 anos, Sare Guilel, Badiénou Gokh
“O que eu mais aproveitei do treinamento foi a informação sobre casamentos prematuros. O treinamento realmente me afetou. Eu sou uma prova real disso, visto que fui dada em casamento aos 16 anos de idade, e eles suspenderam os meus estudos, algo de que me arrependo até hoje.
Após o treinamento, fui falar com a enfermeira chefe do nosso centro de saúde da vizinhança, e eles me deram informações consistentes com o que eu aprendi com a ajuda da ARTIGO 19. Compartilhei as informações que havia obtido fazendo algumas visitas domiciliares”.
Ramatoulaye Ba, 45 anos, Parteira Tradicional, SaréGuilel
“Após o treinamento, fiz perguntas em um consultório médico, e fui informada para evitar partos em casa, e também que gestações em mulheres muito jovens podem causar fístulas.
Depois, também fui até a vila onde nasci (Dialoubéfoulabé), a 15 km de Tamba, para compartilhar as informações com as pessoas de lá e conscientizá-las sobre os perigos dos partos em casa e de casamentos prematuros. Eu fiz uma reunião com as mulheres da vila para compartilhar informação e aumentar a conscientização.
Francamente, a informação é importante na medida em que ela me permitiu entender que uma fístula é curável e isso me permitiu trazer o assunto para a atenção de todas as pessoas envolvidas”.
Aminata Diallo, Badiénou Gokh em Darou Salam, 49 anos
“Depois do treinamento, fui me encontrar com o Sr. Babacar Gaye (UNFPA). Ele me deu alguns pôsteres e documentos de forma que eu possa organizar uma atividade para a conscientização sobre o assunto da fístula. Mais tarde, fui me encontrar com o irmão mais velho de uma mulher que tem uma fístula, e eu a levei ao hospital”.
Soumkhary Sané, Comerciante, 50 anos
“A partir do treinamento, eu conclui que as mulheres tiveram coragem de se expressar. Eu conversei com a enfermeira do nosso centro de saúde e com a Badiénou Gokh, que me disseram que não precisamos estigmatizar as mulheres com fístulas, e que uma fístula é curável.
Eu havia me encontrado com uma mulher da etnia Fula que apresentava sinais. Eu me aproximei dela e a coloquei em contato com Aminata Diallo, uma Badiénou Gokh, para que ela a ajude a conseguir um melhor tratamento dos centros de saúde. Nós também organizamos atividades de conscientização na vizinhança, para jovens e meninas que ainda não estão na idade de casamento, com a intenção de prevenir fístulas”.
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[1] Badiénou Gokh é uma iniciativa comunitária por meio da qual mulheres mais velhas tornam-se mentoras de mulheres mais jovens, aconselhando-as a respeito de técnicas que poderão ajudá-las a ter uma vida mais saudável, tanto para si quanto para as suas famílias.