O resumo de política da ARTIGO 19: ‘Intermediários da Internet: Dilemas Sobre a Responsabilidade Civil’ trata dos desafios que os regimes de responsabilidade civil apresentam para o exercício da liberdade de expressão online.
Além disso, sugerimos soluções para lidar com esses desafios. Particularmente, propomos um modelo de responsabilidade civil para intermediários, compatível com as normas internacionais a respeito da liberdade de expressão.
Quem são os intermediários da internet?
Intermediários da internet é um termo abrangente que se refere às entidades que tornam possível, às pessoas, se conectar à internet e transmitir conteúdo.Há vários tipos diferentes de intermediários, incluindo os provedores de acesso à internet, os prestadores de serviços de hospedagem na web, mídias sociais e buscadores. Os intermediários diferem dos ‘provedores de conteúdo’. Estes últimos são indivíduos ou organizações responsáveis pela produção de informações e pela postagem das mesmas online.
Por que devemos nos preocupar com o que a lei diz a respeito dos intermediários?
Tendo em vista o volume de conteúdo potencialmente ilegal ou prejudicial, transmitido mediante o uso dos seus serviços, e as suas condições técnicas para controlar o acesso a tal conteúdo, tem havido cada vez mais pressão, por parte dos governos e de grupos de interesses, sobre os provedores de internet, para que os mesmos ajam como os “guardiões” da internet. Frequentemente, isso é feito por meio da adoção de leis que responsabilizam o intermediário, financeira ou criminalmente, se o mesmo deixar de filtrar, bloquear, ou remover o conteúdo considerado ilegal. O resultado é que empresas privadas passam a censurar o conteúdo, em nome do estado, sem que sejam observadas as salvaguardas apropriadas ou os mecanismos de atribuição de responsabilidade. Mas isto não é tudo.
Mas você sabe que os intermediários censuram o conteúdo de que eles não gostam, de qualquer forma?
Exatamente. Alguns intermediários removem conteúdo, em conformidade com as suas condições gerais (T&Cs). Isto pode ser um problema no que se refere à liberdade de expressão, porque, frequentemente, os T&Cs não respeitam as normas internacionais a respeito da liberdade de expressão. Além disso, os intermediários não observam os procedimentos adequados ao fazer isto: frequentemente, não há normas claras nas quais os usuários possam se basear, e, frequentemente, também, não há mecanismos de contestação que os usuários possam usar para questionar as decisões dos intermediários de remover o seu conteúdo. Mas a ARTIGO 19 trata dessa questão em outro documento de política.
De que forma a imposição da responsabilidade civil sobre os intermediários ameaça o exercício da liberdade de expressão online?
Isto é extremamente problemático por uma série de motivos:
- A experiência tem demonstrado que os intermediários pecam por excesso de zelo e removem ou bloqueiam conteúdo perfeitamente legal.
- Os intermediários removem conteúdo sem que um tribunal ou um órgão independente tenha determinado se o conteúdo que motivou a reclamação é ilegal ou não.
- Não há transparência no seu processo decisório e não há direito à contestação.
Quais são os modelos diferentes de responsabilidade do intermediário?
Há vários modelos no mundo inteiro:
- Responsabilidade direta – por exemplo, na China, onde os intermediários são obrigados a monitorar ativamente o conteúdo. Se não o fizerem, estão sujeitos a sofrer sanções.
- Regime de porto seguro – por exemplo, em Cingapura, Gana, Uganda, África do Sul e UE, onde os intermediários são, de fato, imunes à responsabilidade civil se observarem os procedimentos de ‘notificação e remoção’.
- Imunidade quase absoluta de responsabilidade civil no que se refere ao conteúdo produzido por terceiros – o modelo preferido pela ARTIGO 19 – por exemplo, nos EUA e Chile, o intermediário não é responsabilizado pelo conteúdo produzido por terceiros, desde que não faça nenhuma intervenção nesse conteúdo. O intermediário somente se vê na obrigação de remover conteúdo ao receber ordem de um tribunal ou outro órgão adjudicatório independente (‘modelo de base judicial’).
Por que a ARTIGO 19 prefere um modelo com base jurídica?
A ARTIGO 19 acredita que, por uma questão de princípio, os intermediários não devem ser responsabilizados pelo conteúdo produzido por terceiros. O fato de os intermediários terem os recursos técnicos para impedir o acesso ao conteúdo não significa que eles são as entidades mais bem posicionadas para avaliar se o conteúdo em questão é “ilegal” ou não. Essa determinação deve caber, antes de mais nada, a um órgão judicial independente, e não a uma empresa privada.
Mas será que esse processo não é muito demorado e caro?
Sim. Reconhecemos que um modelo com base jurídica pode ser complicado e caro. É por isto que estamos defendendo a implementação de um modelo de notificação e notificação para lidar com as reclamações que não envolvam alegações de crimes graves como difamação, direitos autorais ou privacidade. A seguir apresentamos uma explicação mais detalhada.
O que é “notificação e remoção”?
Os sistemas de notificação e remoção estimulam os intermediários a remover o conteúdo a partir do momento em que são ‘notificados’ por entidades privadas ou órgãos de segurança, de que um certo conteúdo é, supostamente, ilegal.
Isto significa que qualquer um pode reclamar e pedir ao intermediário que remova uma determinada declaração ou conteúdo, sob a alegação, por exemplo, de que o mesmo é difamatório, ou constitui uma violação de direitos autorais ou privacidade. Em muitos países, isto é o suficiente para que o intermediário remova o conteúdo em questão, seja ele, de fato, ilegal ou não. Se o intermediário não remover o conteúdo quando notificado, ele pode ser responsabilizado por esse conteúdo.
Do notice-and-takedown procedures violate freedom of expression?
Yes. ARTICLE 19 advocates for the abolition of notice-and-take down procedures because they are deeply unfair. The person who originally posted the disputed content is usually not informed that a complaint has been made or given an opportunity to respond. Intermediaries usually proceed on the assumption that the content is unlawful and remove it despite the fact that it may be perfectly legitimate. This especially problematic because intermediaries do not have the independence required to balance the competing interests at stake. They also usually don’t give reasons for their decision to remove. Finally, internet users whose content has been removed usually have little or no remedy to challenge the takedown.
O que seria um modelo alternativo?
A ARTICLE 19 advoga a substituição do procedimento de notificação e remoção pelo procedimento de notificação passo a passo. Acreditamos que esse procedimento daria, aos provedores de conteúdo, a oportunidade de responder a alegações de ilegalidade antes que uma ação fosse iniciada. Esse procedimento também reduziria o número de pedidos abusivos, pois ele exigiria um mínimo de informação a respeito das alegações, e proporciona um sistema alternativo de resolução de disputas antes que as questões sejam levadas aos tribunais.
Como funciona o procedimento de notificação passo a passo?
Um procedimento de notificação passo a passo funciona da seguinte forma:
- A pessoa que deseja fazer uma reclamação a respeito de um determinado conteúdo teria que pagar uma taxa e preencher um formulário padronizado, explicando, entre outras coisas, porque o conteúdo em questão é ilegal e onde o conteúdo está localizado.
- Em seguida, o intermediário encaminharia a reclamação à pessoa identificada como o autor do conteúdo.
- Ao receber a notificação, a pessoa que seria supostamente culpada por ter postado um conteúdo ilegal poderia tomar uma decisão de remover o material em questão ou contestar a reclamação por meio de uma contra-notificação, que teria que ser apresentada dentro de um prazo razoável.
- Se o autor do conteúdo resolver enviar uma contra-notificação, o reclamante teria a opção de retirar a queixa ou levar o caso a um tribunal ou outro corpo adjudicatório independente.
- Se o autor do conteúdo se recusar a responder ou enviar uma contra-notificação dentro do prazo especificado, o intermediário teria a opção de remover o material, ou se preferir, manter o mesmo online. Nesse caso, ele seria responsabilizado pelo conteúdo em questão, se a reclamação for encaminhada a um tribunal.
A principal característica desse sistema é que o intermediário é apenas um fio condutor entre entre o autor do conteúdo em questão e o reclamante. O intermediário não é colocado em uma posição na qual ele teria que tomar uma decisão a respeito da legalidade do conteúdo imediatamente após a notificação de uma reclamação. Em vez disso, esse sistema deixa a decisão da disputa, em última análise, nas mãos do autor do conteúdo e do reclamante.
O que se pode dizer a respeito do conteúdo que, de fato, incentive a violência ou a pornografia infantil? Deve-se também usar os procedimentos de notificação passo a passo nesses casos?
Não. O modelo de notificação passo a passo não é adequado para todos os tipos de conteúdo. Nos casos que envolvem alegações de crimes graves, os órgãos de segurança devem ser capazes de ordenar a remoção imediata ou o bloqueio do conteúdo. No entanto, isso deve estar muito claro na legislação, que deve apresentar salvaguardas adequadas. Especificamente, a ordem de remoção ou bloqueio de conteúdo deve ser subsequentemente confirmada por um tribunal dentro de um prazo específico. Iniciativas do tipo disque-denúncia também podem ter um papel preponderante quando se trata de alertar as autoridades a respeito de conteúdo que se suspeita ser criminoso, e que seja disponibilizado online, desde que tais iniciativas funcionem de forma transparente.